domingo, 8 de março de 2020

A relação entre o sofrimento e a imaginação

O sofrimento da pessoa é só uma coisa: não ficar com o que se mostra aqui e agora, conflitar com o que é. O que é, é! Isso é maior do que esse “eu” e seus desejos, volições, intenções, motivações, imaginações... Pessoas estão em sofrimento o tempo todo porque estão imaginando o tempo todo!
Se você sai para pescar, você imagina pegar um grande peixe. Assim, enquanto o peixe não chega, você sofre! Depois, quando o peixe chega, você sofre também, porque ele não é o que você esperava. Se você pega um peixe maior do que esperava, você pode dizer que não sofre por isso, mas eu digo que você sofria até esse instante. O peixe maior acaba de chegar, você tem um pico de satisfação (dá para contar no relógio o tempo que dura esse grande ápice, o grande momento de satisfação, de realização), mas quando acaba esse momento, o pensamento diz: “Agora, tenho que pegar um maior que esse!”. Mas, às vezes, vem um menor, e depois um ainda menor…
Então, o movimento da mente é sempre o de adquirir e, depois, desgostar. Foi assim no seu casamento, foi assim quando nasceu o seu filho… Você teve um momento de grande alegria, mas hoje você olha e não é mais a mesma coisa. O movimento da mente é sempre de ganhar e perder, de busca por sensação. Esse é o movimento da “pessoa”. A “pessoa” vive nessa condição de história psicológica, de imaginação, em todos os aspectos dessa, assim chamada, sua vida. O que quer que ela deseje, não é suficiente! Ela sempre deseja aquilo e um pouco mais, sofre até conseguir e, depois que consegue, descobre que não era exatamente daquilo que ela precisava. Ou, ela pode, aparentemente, ter conseguido a realização do desejo e se sentido satisfeita por um momento, mas logo o movimento da mente entra dizendo que precisa ser diferente, que pode ser melhor, que ainda está ruim.
Então, o movimento da mente é sempre de insatisfação. Ela nunca se completa, nunca se preenche, porque, se isso acontece, ela para, ela perde a importância, a imaginação para de correr. Por isso, que você, em seu Estado Natural, não vive na imaginação, não está nessa “viagem”, nessa identificação com o movimento psicológico do “eu” — “eu”, como um objeto, e um mundo do lado de fora para ser alcançado. Tudo está presente agora, aqui. Então, se você vai pescar, você vai somente pescar…
Eu percebo que a surpresa é o elemento que tem tomado o lugar da imaginação na minha experiência. Então, você vai pescar e o elemento surpresa é um entretenimento tão interessante que ele lança fora o elemento da imaginação. “Vamos ver qual é o peixe que virá!”. Então, não há dor. A dor estaria instalada numa expectativa, na exigência de ter que pegar um peixe que talvez não viesse. Então, esse elemento de curiosidade e surpresa é bem interessante!
A vida com o elemento “surpresa” no lugar do elemento “imaginação” é bem mais interessante, porque o conflito não faz falta; a dor da expectativa frustrada, não faz falta. Essa dor sempre chega para esse elemento não real, mantido e sustentado pela imaginação, nesse mecanismo chamado “eu”. Então, você pode se divertir e, na realidade, tudo fica surpreendentemente divertido quando não há a necessidade de se criar uma expectativa imaginária sobre o momento seguinte. Então, a surpresa, o inusitado, o inesperado, é bem mais interessante. Isso está presente quando não se sabe, quando não se busca saber, quando não se tem interesse em saber, quando não se tem necessidade psicológica de saber, ou seja, quando não há imaginação.
Viver sem expectativa é viver sem ansiedade, sem um futuro psicológico. As pessoas sofrem porque não estão aqui e agora! Elas estão no passado, no futuro, e isso não é nada além de imaginação. Elas têm o que ganhar e o que perder. O que pode se perder causa medo, e o que pode se ganhar está na fantasia de um preenchimento de felicidade eterna. Esse é o mundo do “eu”: sofrimento! Ganhou, pegou o peixe grande (e esse peixe grande pode ser qualquer coisa: casamento, filho, casa própria, carro...), “realizou”, mas não se realizou! É a natureza da mente! Nesse seu imaginário movimento, é natural estar insatisfeita, infeliz, miserável. Isso só é possível quando existe a ilusão do tempo.
Você nunca tem Alegria fora do Agora! Você tem a ilusão de poder estar alegre daqui a alguns minutos ou daqui a algum determinado tempo. Até lá, você está triste... Está triste justamente porque não está alegre ainda! A mente é estúpida! A Alegria está agora! Se Ela não está, é justamente porque você quer que Ela esteja! Para você, um objetivo precisa ser alcançado para a Alegria estar presente, e isso é dor, desejo, ansiedade, expectativa, conflito!
Então, tudo o que você espera é frustração. Eu não disse que o que você vai encontrar é frustração. Eu disse que o movimento da espera já é o movimento da frustração, pois já colocou você em um idealismo fora da Realidade presente aqui e agora.
Se você não encontra o que Você é, você vai imaginar o que você não é! Tudo o que você pode fazer é imaginar o que você não é! Na verdade, você está à procura de Si mesmo, mas faz isso se movimentando na imaginação de objetos, enquanto que o que você busca está aqui e agora, no que Você é! Mas, a mente não sabe disso, porque ela está há milênios se movimentando para fora, para os sentidos, para a experiência, e não para Aquilo que está fora da experiência.
No entanto, se você está Aqui, em seu Ser, a experiência é linda! Mas, se você está absorvido nessa experiência, você está completamente alienado da Consciência, que é Meditação. Então, você vive em frustração, porque vive em expectativa. Se você descobre o que é estar Aqui, não importa o lugar, você sempre está Aqui! Do contrário, você se mantém nessa ilusão do tempo psicológico, sempre esperando a Alegria, sem nunca se perguntar: “Quem é esse que espera?”.
*Transcrição de uma fala realizada no Retiro de Carnaval, na Ilha de Itamaracá/PE, em 25 de fevereiro de 2020 – Acesse a nossa agenda e se programe para estar conosco:http://mestregualberto.com/agenda/agenda-satsang

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