terça-feira, 18 de maio de 2021

Livre-se do “apegado”

Você tem uma tendência de separar objetos de pensamentos, daí surge a preocupação de se livrar dos objetos. Essa ideia de se livrar dos objetos começa a ter uma valorização para você porque você acredita que, assim, estará se livrando dos apegos. Compreenda uma coisa: os objetos não nos causam problemas! Então, não se preocupe com eles, não tente se livrar daquilo a que você está apegado. Livre-se de “você”, e não daquilo. Livre-se dos pensamentos, e não dos objetos.

Os objetos não fazem mal a você; os pensamentos, sim. São os pensamentos sobre os objetos, lugares e pessoas que sustentam esse falso “eu”. O problema não é você com os seus apegos, o problema é só “você”! Não tem apegos se não tem “você”, e não tem como se livrar de apegos se “você” está aí. Você vai lutar até o final dos seus dias! Quando a mente disser que você se livrou de algo, ela terá adquirido uma outra coisa, então você sempre estará dentro desse jogo, e isso é típico do ego – ele não larga o osso.

A vida do ego está na busca de sensação – a mente egoica a imagina e usa os objetos para obtê-la. Não é você que está apegado às coisas, é a mente, esse “sentido de você”. Como você se confunde com a mente, ela passa a ser “você apegado”.

As pessoas têm medo de perder suas coisas porque “pessoa” é, basicamente, esse senso de falsa identidade que vive se sustentando em pensamentos sobre objetos, pessoas e lugares. Todos os seus apegos estão em cima disso. É claro que eu poderia acrescentar aqui sentimentos, sensações, emoções, imaginações... A tudo isso a mente está apegada; esses são os objetos dela.

Você só tem problema com objetos, sejam externos ou internos. Os objetos externos são a casa, o carro, o jardim, o quadro na parede, sua relação com o namorado, marido, filho, filha, parentes, os lugares que você ama frequentar, também os que você odeia, não quer estar lá, dos quais você foge... Tudo isso coloca você nessa dimensão de um falso “eu” vivendo suas experiências de apegos.

No entanto, isso está totalmente dentro da mente, não está do lado de fora! Na verdade, é a imagem do namorado, do marido, do filho, da filha, que você ama ou da qual sente raiva, então é o que está dentro de você! Portanto, não se trata de objetos externos, mas daquilo que a mente transforma numa fonte de identidade, nesse “gostar” e “não gostar”.

Então, seja internamente ou externamente, o seu problema é sempre uma relação equivocada com o que o pensamento está dizendo sobre aquilo, com o que o sentimento está reforçando sobre aquilo. Aqui é que está a vida dessa falsa identidade.

Você pergunta “como me libertar de certas coisas?”, como se você já tivesse se libertado de outras! Isso é uma falsa consideração que o ego faz: “Eu já me libertei de algumas coisas, falta eu me libertar de outras”. Isso é completamente falso, porque essas coisas não são o seu problema, o seu problema é “você”, sua relação equivocada com a sua experiência de pensar, sentir e se emocionar. Isso coloca você numa condição de interna desordem, de interna confusão, de interno sofrimento.

Tudo isso porque a mente está produzindo um senso de identidade nessas experiências de relação com o mundo externo e interno. O mundo interno é esse que ela imagina e o mundo externo é esse que ela interpreta.

Se você for para uma caverna, lá em uma daquelas montanhas do Himalaia, seu apego estará lá. Não importa se o seu apego é apenas a uma caneca que você usa para tomar água no riacho; não importa o tamanho, o valor do objeto, porque sua dificuldade não é com os objetos.

Você pode externamente, fisicamente, ter as coisas mais apreciadas, as quais alguém ou especialistas podem classificar como coisas muito valiosas, mas isso não faz de você uma “pessoa”, muito menos uma “pessoa” sofrendo, em conflito, em razão do apego. O “sentido de pessoa” em conflito em razão do apego nunca é determinado pelas coisas que o cercam, mas é determinado, sim, por você fazer do pensamento a sua experiência naquela relação.

Então, se a sua experiência está toda baseada no pensamento e nos valores que ele dá àquilo que está à sua volta, aí está o problema. Objetos são inofensivos e, aqui, objetos são pessoas, lugares, coisas, sentimentos, emoções, sensações e também pensamentos.

A etiqueta que o pensamento dá às experiências do próprio pensamento, da emoção, da sensação, dos objetos, o quanto de investimento de identidade a mente extrai dessas experiências, é o que determinada a dimensão desse falso centro, desse falso “eu”. O problema não são as coisas que você vê à sua volta – aquelas coisas que todos dizem que são suas. O problema está presente quando há o sentido interno de ser proprietário delas, de não poder deixá-las, de não poder perdê-las, de se imaginar em dor só em se ver sem elas.

Não se livre dos apegos, tome consciência da Liberdade da sua Natureza Essencial e, assim, o “sentido do apegado” desaparecerá, esse sentido de ser alguém possuindo, controlando, agarrado, enciumado, temeroso de perder, exclusivista, possessivo...

E por que eu uso a expressão “objetos” para pessoas, lugares e coisas? Porque para esse “senso de identidade separada” tudo são objetos. Tudo tem só um propósito para esse “senso de separação”: satisfação, preenchimento, realização em algum nível emocional, sentimental, psicológico, sexual e de diversas outras formas. Isso é o que eu chamo de objetivação: transformar toda experiência em um propósito de preenchimento, de realização, de satisfação.

É aqui que está o sentido de separação, de um “eu” separado, de uma entidade com problemas para viver e para morrer. Essa entidade não quer morrer, mas tem problemas em continuar viva. Ela vive em tortura e se vê assustada, apavorada, com a ideia de desaparecer.

Ego ama sofrimento porque isso lhe dá vida! A ausência disso representa, para esse sentido egoico, o fim de tudo; e ele está certo: é o fim de tudo! É o fim do sofredor, do possessivo, do dominador, do controlador, do enciumado, do ensimesmado, do que vê amigos e inimigos, do lutador, do que está lutando para vencer, lutando para realização de algo… não existe nada disso!

Você em seu ser não tem nada para realizar porque nada lhe falta, não tem nada para segurar porque você não precisa de alguma coisa para possuir, para controlar, para dominar, para ser dono. Como se revela essa Vida? Na Vida! Como não se revela essa Vida? Vivendo permanentemente dentro da sua cabeça, com um mundo todo engendrado pelo que o pensamento diz, escuta, traduz, interpreta, conclui, julga, compara, aceita, rejeita, imagina...

Sabedoria é o Despertar do seu Divino Estado de pura Consciência. Um Buda não pode mais ser tocado pelo sofrimento, uma vez que o sofrimento é resultado do apego. Você acaba de ter uma aula sobre o que é o apego! Agora você já sabe: tem a ver com esse seu modo particular de se deparar com a vida, não tem nada a ver com o que o destino tem produzido à sua volta.

Tudo surge em razão de uma destinação, o que é parte de um jogo misterioso dessa mesma Consciência, dessa mesma Presença Divina. A única coisa de que você precisa diante disso tudo é estar em seu Ser, assim você permanece livre de toda essa destinação, de todo problema que o pensamento constrói fazendo suas considerações, tentando agarrar e segurar as coisas e sofrendo por elas.

Você precisa de um novo cérebro, de um novo coração, de uma nova Alegria. Essa alegria que a mente conhece, baseada em experiências que ela mesma interpreta como satisfatórias e realizadoras, precisa desaparecer. A Meditação lhe dá uma Alegria que não é deste mundo! A Meditação lhe dá um novo cérebro, que não gira em torno de reatividade, de pensamentos, de sentimentos, de emoções. Isso é uma qualidade nova de ser!

É assim que têm vivido os Sábios em toda a história da humanidade. Eles carregam uma outra Alegria, então é muito simples descartar esse mundo, pois ele já não está aqui mais. Para aquele que está em seu Ser, para aquele que permanece em sua Vida Divina, o mundo é só um sonho, como aquele que você tem à noite.

Você precisa encontrar a Liberdade de “estar morto” para esse mundo antes da morte chegar. Um homem como Cristo, Buda, Ramana, Jiddu Krishnamurti, não tem mais nenhum valor nesse mundo, não faz parte desse mundo. Nesse mundo, o que prevalece é o medo, o desejo, a ignorância, a valorização de objetos, de pessoas, de coisas, de lugares, de sentimentos, de emoções, de sensações... Uma vez que você está além dessa identificação com o corpo e com a mente, nada mais pode segurá-lo nesse mundo. Game over, fim do jogo!

Então, você não fica livre dos objetos, mas da ilusão do sujeito. Você não fica livre do corpo, mas da crença “eu estou dentro deste corpo”. Você não fica livre da família, mas da ilusão de que você faz parte de uma sociedade, de uma cultura, de uma nação, de um planeta.

*Transcrição de uma fala ocorrida em 12 de abril de 2021, num encontro aberto online. Para informações sobre os nossos encontros, clique aqui.

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