Há toda uma preocupação naqueles envolvidos com essa busca da Verdade, da Sabedoria, da Realização, relacionada com a questão das práticas. Hoje, posso falar um pouco sobre isso aqui. Estamos para entrar em um retiro, mas o propósito aqui não é a prática espiritual, pois não existe tal coisa.
Há, basicamente, algumas práticas dentro dessa “busca espiritual”. Dentre elas, estão as práticas da chamada “meditação”. A mais comum consiste em aquietar o corpo, fechar os olhos e forçar o pensamento ao silêncio, ou, através de alguma técnica, silenciar esse movimento do pensamento. Isso é algo muito comum dentro das práticas espirituais. Portanto, essa é uma forma convencional de prática, de busca.
Hoje, existem alguns métodos mais modernos do que essa antiga prática de aquietar o corpo e a mente, para se obter esse mesmo resultado, que são realizados através de aplicativos de celular ‒ você baixa um desses aplicativos e faz sua prática espiritual. Todos esses métodos fazem a mesma coisa: trazem relaxamento físico, psicológico, emocional. Se você estiver diante de um relógio daqueles antigos, com o martelinho batendo no ponteiro dos segundos, ao ouvir e prestar atenção a esse som, a cada uma daquelas suaves batidas na passagem dos segundos, e ocupar-se inteiramente com isso, você terá um efeito parecido.
Basicamente, a técnica causa um efeito cerebral de aquietação, relaxamento, algo próximo do sono. Assim são essas técnicas de meditação guiada, elas têm o mesmo efeito do som da mudança dos segundos naquele relógio antigo, daquele “tic-tac, tic-tac”. Assim, qualquer método que você conheça é hipnótico, de relaxamento cerebral e físico. Se relaxa o cérebro, relaxa o corpo. Nosso trabalho aqui não é esse, pois não se trata de um relaxamento psicológico, físico, emocional. Isso você consegue dormindo ou por meio de algum estímulo de indução externa.
Aqui, o seu trabalho é permanecer livre do que a mente diz sobre quem você é, sobre o que está acontecendo externa ou internamente. Quando digo “externamente”, me refiro ao próprio movimento do que se mostra, momento a momento, na vida. Já a expressão “internamente” diz respeito aos pensamentos e imagens que surgem dentro de você, ou seja, “o que está acontecendo”. Então, permanecer desidentificado desse movimento interno, é permanecer desidentificado do que o pensamento, a sensação, a percepção e a emoção produzem aí. Estar desidentificado do movimento externo, por sua vez, é não estar identificado com a experiência, com o que surge neste instante. Então, agora estamos tocando na Real Meditação, que possui um sentido inteiramente diferente de uma prática, porque Nela você não realiza qualquer prática.
Se você realiza uma prática, está dentro de um processo mecânico de realização, e, naturalmente, de conquista de algum resultado, o qual, certamente, estará se ajustando ao seu nível de empenho, à sua capacidade de realizar. Então, isso tem algo a ver com esforço, com uma aquisição, com o alcance de um objetivo. A questão é: quem é esse que realiza ou pode realizar isso? É evidente que isso está dentro do limite do próprio “eu”, do próprio “indivíduo”, da própria “pessoa”.
Meditação não é isso! Meditação é quando a “pessoa” não está, portanto, não se trata de um esforço, de uma aquisição, de uma realização pessoal. Isso não é uma prática espiritual, que requer a presença de um “alguém”. Por isso, a expressão “Realização de Deus” é completamente inadequada para ser usada em Satsang. Fazemos uso dessa expressão, mas ela não diz nada, porque Realização de Deus é a direta Manifestação do Desconhecido, e, aqui, o Desconhecido se manifesta por Si só. Não existe algo que possa ser feito para que Isso aconteça ou não aconteça, porque a Real Meditação não é uma prática. O propósito dos nossos encontros é a Real Meditação, que é a Visitação do Desconhecido, a Realização Divina.
Satsang é esse encontro com a Realidade, com a Verdade, e Isso é Meditação. Não é uma alteração naquilo que é chamado de “nível de consciência”. A experiência de uma alteração de nível de consciência é apenas mais uma experiência limitada, pessoal, algo cerebral, detectável, que pode ser mapeado. A Realização não está dentro da experiência. O que estou dizendo é que a Realização não é para “você”. Realização é a ausência desse “você”, assim como a Meditação, a Verdade.
Quando “você” está, a “pessoa” está. Enquanto existir um “experimentador” na experiência, o senso de limitação, de separação, estará aí. A Meditação é a ausência do senso de separação, do sentido de um “eu” presente, de um “experimentador”. Então, quando você fecha os olhos e relaxa o corpo por meio de um estímulo externo, como uma voz suave ou o som de um mantra sendo entoado, ou mesmo as batidas de um relógio, isso pode produzir uma profunda sensação prazerosa, mas não é Real Meditação.
Isso é muito saudável, faz você dormir melhor, ter menos estresse e ansiedade, traz inúmeros benefícios que podem ser mapeados e comprovados cientificamente, mas isso é somente uma nova sensação prazerosa e relaxante. Por isso, essa estrutura egoica continuará sólida em seu centro, permanecerá em seu movimento, pois esse “eu” estará apenas quieto, porque, agora, o movimento dele será para a quietude.
Antes, havia nele um movimento de inquietude e, agora, existe um movimento para a quietude, devido à facilitação encontrada para que isso ocorra. Então, essas práticas, essas técnicas que vocês aprendem, como a chamada Yoga, a respiração pranayama, a Meditação Transcendental, Mindfulness, tudo isso faz muito bem, aquieta, relaxa o “eu”.
Entretanto, aqui a questão não é obter um estado, que é algo dentro de uma experiência. A Meditação nunca pode ser um estado! Aquilo que é conhecido como “meditação” sempre envolve um certo estado, um estado de bem-estar, de prazer, de relaxamento, de diminuição de velocidade. O ego é muito ativo, a mente egoica é muito ativa, tagarela.
Quando você encontra uma criança muito ativa e a quer quieta, você tem que dar algo para ela fazer. Você dá um brinquedo que chama a atenção dela, então, ela se assenta e começa a brincar. Toda sua atenção agora está no brinquedo, assim, o corpo dela também fica quieto. A criança se assenta no chão, começa a brincar e para de correr pela casa. Dessa forma, os móveis estão a salvo, assim como os jarros de flores! Tudo continuará no lugar enquanto ela estiver ali ocupada com aquele brinquedo. Vocês entendem o que eu estou dizendo?
A mente é algo assim. Se você der algo para ela, que consiga lhe dar alguma sensação, algum estado, alguma experiência de prazer, de relaxamento, de bem-estar, ela vai se ocupar com isso, mas não tem nada a ver com Real Meditação, tem a ver com uma técnica. Você “coloca um brinquedo para criança e ela começa a brincar”, ou seja, você pega uma pessoa religiosa, espiritual, e a coloca para cantar mantras, repetir nomes sagrados, rezar com um terço na mão, respirar de uma certa forma… Você pode também ensiná-la a olhar para o momento presente, para aquilo que acontece do lado de fora, de forma que ela se deixe absorver por completo pela experiência presente. Tudo isso são truques, os quais não destruirão essa forte e sólida estrutura do sentido de separação, desse “eu”. O medo, a inveja e todas as idiossincrasias da “pessoa”, do senso pessoal, continuarão lá. Não é isso?
Estou dizendo que a Meditação Real requer um terreno Real, que é permanecer diante de si mesmo, momento a momento. Você descobre a Meditação limpando o terreno para que Ela floresça. Meditação é essa Presença do Desconhecido, mas Ela se manifesta quando o conhecido não está. Isso não requer nenhuma técnica, nenhuma prática espiritual, nenhum tipo de “brinquedo”, de rezas, canções, danças, nem o uso de substâncias, como pílulas ou chá, modos de respirar ou qualquer outro tipo de coisa.
Aqui, é olhar e ver o que está aí presente. O que é esse “conhecido”? O que é esse terreno? Qual é o terreno do “eu”, desse senso do “mim”, com suas escolhas, desejos, anseios, receios, medos, inveja, ciúmes, toda essa maluquice da “pessoa”? Quando esse terreno fica limpo pela observação, a Real Meditação tem espaço. Quando não há mais o “louco”, não há mais a necessidade do “hospício”. É isso.
* Transcrito a partir de uma fala em um encontro online, na noite do dia 16 de Novembro de 2019 – Para informações sobre os nossos encontros, clique aqui.
Perfeito!!
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