terça-feira, 18 de fevereiro de 2014

Você não é confiável, a Graça sim!

Mais uma vez em mais um encontro em Satsang. Satsang é um encontro com esse desafio. O desafio que você tem em Satsang é se encontrar. Se encontrar significa ir além de suas crenças, além de seus padrões, além desse gostar e não gostar, além dessa postura individual, pessoal, essa coisa da preferência. Quando nós falamos sobre o sentido de uma identidade separada, isso fica muito vago. Isso só começa realmente a ser visto nesse incômodo. Na verdade, você está cheio disso, e você não tem a mínima consciência. Você está permanentemente num estado de autodefesa. Nesse estado de autodefesa, você não quer ser tocado, não quer ser invadido, você não quer ser ferido, magoado, ofendido. O desafio para você é algo muito doloroso.

E o desafio aqui é o desmascaramento desse sentido de identidade presente. É por isso que Satsang é mortal. Essas falas em Satsang estão apontando exatamente para isso. É muito fácil ouvir uma fala como essa, e a mente logo racionaliza acerca disso, cria ideias sobre isso, tira conclusões acerca disso, dessa coisa que está sendo dita. No entanto, isso é inofensivo assim. Mas, na verdade, isso não é Satsang. Satsang é estar diante deste desafio que é a Graça, que é esse desmascaramento, que é poder constatar a possibilidade do fim dessa ilusão, da ilusão dessa identidade – essa que gosta, não gosta, controla, essa que não quer ser ferida.

Então, nós ficamos com aquilo que é prático quanto a isso. Já não estamos mais diante da teoria. É nesse sentido que Satsang funciona, é o espelho dessa Presença na figura do Mestre, daquele que está desperto, que não está inconsciente quanto a isso. Só esse é um espelho ideal. É isso que eu chamo de real investigação, é permitir-se olhar para isso, permitir-se não ser poupado. A sua mente está cheia de razões, cheia de projeções, cheia de crenças, ideias. Você até mesmo sabe como o Mestre deve agir. Você sabe até mesmo escolher o "mestre ideal". O mestre ideal para você é como aquele espelho que não pode refletir. O mestre ideal para você é aquele que ama você. Esse "você" é a ilusão. Esse "você" é esse suposto "eu", essa suposta identidade separada – caprichosa, vaidosa, ocupada com ela própria, que sabe tudo.

E é exatamente isso que tem que ser visto por você: a crença que você faz acerca de si mesmo. Um espelho real, um espelho ideal, é a Presença viva de pura Consciência, essa chama que devora a ilusão. Aí está o Mestre. É desconfortável, doloroso, difícil de lidar, difícil de aceitar, mas é assim. Seu ego vai querer fugir, mas ele jamais vai dizer para você que ele é o ego. Mais uma vez, ele vai se passar por você nessa "inteligência" de resolução, nessa "inteligência" de não ser manipulado, nessa "inteligência" de ter o perfeito discernimento. Na verdade, você quer essa libertação, mas do modo que você pode querer essa libertação – ainda se mantendo sendo "você". É "você" liberto, do seu jeito.

Tudo isso são truques, truques de continuidade dessa falsa identidade. O que estamos dizendo nesta fala, neste encontro, nesta noite, é que esse ego, esse "eu", esse "mim", essa falsa identidade, esse sentido de "alguém", não vai se render, não vai se entregar. Ele vai continuar fugindo. Ele vai sobreviver a todas as bombas, ataques terrestres ou aéreos, a toda e qualquer investida da Graça. Ele vai se disfarçar, ele vai se esconder, ele vai escapar. Ele não diz que é você, você não sente que é ele, mas é assim que ele consegue. É por isso que nós temos insistido nessa coisa, na importância de Satsang, quando esse "você" fica exposto e a dor aparece, o medo aparece.

Alguns de vocês já decidiram ir embora. Tem a dor em algum lugar aí acontecendo. Alguns já foram embora, e outros mantêm uma certa distância para não doer muito. Mas eu tenho que dizer para vocês uma coisa: isso não funciona. Realizar isso é atravessar essa dor, é descobrir que isso tudo é uma ilusão, que não há qualquer desafio mesmo – apenas essa suposta identidade sente isso como algo desafiador, está disposta a fazer qualquer coisa para escapar disso.

P: A maior dor é se achar um "eu".

M: Sim, é isso mesmo. A maior dor é o sentido de separatividade. A maior dor é o sentido de uma identidade separada. A maior dor é o medo. O que estamos apontando para você em Satsang é o fim do medo, o fim desse sentido de separação. Estamos apontando a você, em Satsang, para a bem aventurança, para a felicidade, para a liberdade, para o amor, para a paz. Estamos apontando em Satsang para a sua Real Natureza, para a Real Vida. Você não é confiável, a Graça sim. Essa Presença é confiável. Deus é confiável. É por isso que Ele toma forma. Se você não pode encontra-Lo na forma, você não pode encontra-Lo fora da forma. É na forma que você se vê, é na forma que você tem que econtra-Lo.

Quando você O encontra na forma, você está além da forma. Se você não poder encontrá-Lo no Mestre, não pode encontrá-Lo em si mesmo. Esse "si mesmo" é só uma teoria, é só um conceito mental, é só uma crença, é só a "não forma", é só o conceito de algo dentro. Isso porque, na verdade, você se vê no corpo, você se vê na forma. Existem alguns pontos aí que podem ser investigados. Podemos falar um bom tempo sobre isso. O problema é que a sua mente vai editar essa coisa, ela vai fazer recortes. Ela sabe habilmente escolher o que lhe convém. Assim, não adianta nós falarmos sobre isso fora desse encontro presencial. Então venha ao Satsang presencial olhar em meus olhos, e me permita olhar em seus olhos.

Permita-se ter raiva de mim, ver inveja em mim, ambição em mim, desejos e medos em mim; permita-se ver arrogância em mim, prepotência, personalidade forte, um ego muito grande. Tudo o que você está vendo é você mesmo, a coisa está toda aí. Na verdade, você está vendo qualquer coisa fora de si mesmo. Mas o que você está vendo fora de si mesmo é parte da crença que você tem acerca do mundo, e isso está assentado nessa base, na base dessa falsa identidade, se passando por você. Isso significa pura inconsciência, isso significa medo. Ego é medo. A pessoa é medo. Enquanto a pessoa estiver aí, o medo está aí. A pessoa aí é a ilusão de alguém vendo coisas do lado de fora.

O que estamos dizendo para você sempre em Satsang é que não tem jeito, você não tem salvação. Você não tem conserto, não há tratamento para você. Tem mesmo é que desaparecer. Isso é algo simples, mas não é algo fácil. Isso é o fim da inconsciência. Isso é o seu fim. É o fim da pessoa.

P: Eu realmente estou cansado do sofrimento psicológico, mental, da mente tagarela. Me parece que o simples conhecimento das coisas espirituais, filosofias, não está me ajudando a me tornar uma pessoa melhor.

M: E agora? O que você acha que pode fazer ainda?

P: Realmente não sei. O que sei é que não tem funcionado.

M: É muito bom isso. Você chegou num ponto excelente. Espero que tenha chegado mesmo nesse ponto. Provavelmente você já parou de ler todos os livros, já parou de praticar, já parou de frequentar sebos esotéricos, místicos, religiosos, filosóficos.

P: Sim. E junto com isso me dá um vazio por não ter chegado lá.

M: Aí está o ponto. Despertar, realizar Deus, Realização, Iluminação – qualquer que seja o nome para Isso – não é chegar lá. Esse chegar lá é só uma projeção ainda da mente. Essa é a primeira coisa a ser compreendida: não há como chegar lá, porque não tem lá, não tem alguém aí para chegar. Despertar, Iluminação ou Realização é o fim da ideia de alguém para chegar em algum lugar. De forma objetiva, prática, o que posso lhe dizer é que um trabalho se faz necessário. Mas não é um trabalho no sentido de uma procura, de uma prática, de uma dedicação à espiritualidade ou à filosofia. É um trabalho no sentido da investigação daquilo que se passa por você e que não é você, não é a sua Real Natureza.

Então, isso termina com essa ilusão – a ilusão do ego, a ilusão do "eu", a ilusão do sentido de alguém. Quando isso termina, o Despertar está presente, a Iluminação está presente. Isso é o fim da insatisfação, isso é o fim do sofrimento. Na Índia eles chamam isso de Sat-Chit-Ananda, Ser-Consciência-Felicidade. Satsang significa estar diante disso diretamente, estar diante dessa autoinvestigação, ou dessa investigação de si mesmo, que é meditação, que é essa entrega à sua Real Natureza. Eu lhe recomendo, e a todos presentes: venha ao Satsang. Você não pode realizar isso, mas pode estar vulnerável, se permitir essa realização em Satsang. Não é você que realiza, é Deus que realiza, é a Graça que realiza, é o Mestre que realiza, é essa Presença que realiza, é a sua Natureza Real tomando ciência dela própria. Isso é o fim desses padrões mentais. Isso é tudo o que a mente não quer fazer

P: Já li de uns 8 a 9 acordados a mesma ladainha: o "eu" não é real, é uma ilusão, mas e daí? De que me serve entender e compreender isso?

M: É exatamente isso. Isso não serve para nada. É só mais uma crença. Ler o que os acordados dizem ou disseram, ouvir o que eles dizem ou disseram, nada disso funciona. O que funciona é essa entrega a essa Presença. O que funciona é a ação dessa Graça, é estar diante desta Graça, a Graça em forma. O Mestre em forma, o Acordado em forma. Ele não é suas palavras, Ele não é suas falas, Ele é Você, Ele é a sua Natureza Real, é esse espelho real. É onde o trabalho acontece. Ele vai lhe provocar, Ele vai lhe contrariar, Ele vai lhe aborrecer, Ele vai lhe chatear. Ele será tudo o que você precisa ver em si mesmo. O seu anjo mau e o seu anjo bom, o seu próprio satanás e o seu próprio Deus. E é só você que vai ver isso, não tem ninguém mais para ver isso em seu lugar. Isso funciona, o mais são só teorias, conceitos, crenças, palavras, blá blá blá. É isso aí.

*Transcrição de uma fala ocorrida em 12 de fevereiro de 2014, num encontro aberto online. Para informações sobre os nossos encontros, clique aqui.

quarta-feira, 12 de fevereiro de 2014

O Real Sentido da Oração

P: Qual é a diferença entre acreditar que não existe, que não se é nada, e a baixa autoestima?

Mestre: Onde houver qualquer crença, em cima dessa crença, uma conclusão aparece, e essa conclusão é mental. "Eu não sou importante nem necessário, eu não existo" e a baixa autoestima, na verdade, são a mesma coisa, do ponto de vista da crença. A crença de que não se é importante, ou de que não se existe e a baixa autoestima são só uma crença, e não tem nada de real nisso. Se você acreditar que não existe, se você acreditar que não é importante, ou qualquer outro tipo de crença desse tipo, é a mesma coisa. Aqui não se trata de acreditar em alguma coisa. Qualquer forma de crença, positiva ou negativa, é só uma crença.

P: A autoinvestigação é o melhor meio de derrubar o ego? Como posso fazê-la?

M: Você não pode derrubar o ego. Não há nenhum ego para ser derrubado. A ideia de derrubar o ego ainda é do ego – desse ego que não é real, mas que se apresenta real tentando fazer alguma coisa, como essa coisa da autoinvestigação, como essa coisa de derrubar o ego. Esse trabalho de autoinvestigação não é seu, é um trabalho da Presença, é um trabalho da Graça, é um trabalho de Satsang.

Não há qualquer esforço que você possa fazer para realizar isso, embora o trabalho seja importante, seja necessário. Esse trabalho de autoinvestigação – que não é ego-investigação, que não é mente-investigação – é Graça-investigação, é Presença-investigação, é Satsang-investigação.

Não há como deixar de atrelar o Despertar a uma ação da Graça, a um trabalho da Graça, a um trabalho dessa Presença. Aqui, só lhe resta um "fazer", e esse "fazer" é deixar de fazer, é ficar quieto, é se entregar a Deus, que é a Graça, que é a Presença. Isso é Satsang. Há um poder que faz isso. O seu trabalho não é seu trabalho. Você não pode encontrar esse caminho – esse é o ponto. Você não pode dar o seu jeito. Isso é algo que vem até você, mas você não pode ir até Isso. É o Mestre que encontra você... Não é você que encontra o Mestre. É a Graça que alcança você... Não é você que alcança a Graça. Coloque o seu coração na Graça, na Presença. Fique ligado, no coração, com essa Presença, porque somente assim você fica quieto, e a Graça faz o trabalho.

O seu trabalho é ter essa disposição. Você faz o seu trabalho e a Presença faz o trabalho dela, e tudo isso é o próprio trabalho da Presença, é o próprio trabalho da Graça; só tem ela mesmo. Este é o real sentido da oração: essa disposição de não questionar, não discutir, não se proteger, não se defender. Isso é real rendição, real entrega. O grande momento em Satsang é o momento do silêncio, da entrega. Esse é o momento do coração, nessa disposição de deixar tudo, de soltar tudo, de colocar tudo diante dessa Presença; é o sentido de tocar os pés do Guru. O Guru não é outro senão você mesmo, sua Natureza Real... É o divino aí, em seu próprio coração.

Essa é a única coisa que você pode fazer. E isso é o fim dessa ilusão, a ilusão do ego, a ilusão desse "mim". Ramana dizia que a porta de Deus está sempre aberta, mas a verga da porta é muito baixa, e para atravessar essa porta, só de joelhos. E ele dizia: são muito poucos os que conseguem.

Vocês querem ouvir o meu segredo?

P: Não tem ninguém aqui para querer saber coisa alguma.

M: Isso é verdade? Perguntem a si mesmos se isso é verdade. Eu não sei porque a sala está tão cheia se isso é verdade... Quando quiserem saber o segredo para alcançar Deus, perguntem. Vocês fazem perguntas muito inocentes, que não atingem nada, como flecha sem ponta; flecha sem ponta não penetra, não atinge o alvo.

P: Qual é o segredo?

M: Só um teve a coragem de perguntar qual é o segredo. E qual é o segredo para realizar Deus? Eu vou dizer para você: dê tudo ao Guru. Tudo o que ele lhe pedir, você dá a ele. Dê a ele, quando você encontrar o Guru, puder reconhecer o Guru – isso é quando você só vê Deus... Foi o que eu vi em Ramana. Ele era o Cristo a quem eu orava, diante de quem eu jejuava, e ele apareceu a mim. Pediu todas as minhas crenças, minhas defesas, meus desejos, todas as minhas seguranças, todos os meus medos.

P: Entregou orando?

M: Sim. Oração é entrega. A oração abre a porta para essa entrega. Assim você não pode mais desconfiar de Deus e reivindicar nada para si mesmo. Então, essa falsa identidade cai, porque ela não pode resistir a essa amorosa Presença.

P: Expor os problemas para si mesmo e admitir os erros é um começo?

M: Não; nada disso. Nem mesmo o direito de ter problemas você tem, porém, admitir os erros você pode, quando você entrega tudo a Deus. Você não tem mais o direito de sentir-se um pecador, nem de buscar ser um santo. Acontece quando seu coração queimar diante da sua Presença, e Ele é o bem amado, porque somente Ele é confiável. Você não existe mais para admitir nada, para errar novamente. Se você não pode chorar por isso, essa deve ser a sua primeira oração, a sua primeira entrega. Seja honesto quanto a isso, e diga a Ele que você não pode chorar por isso, que você não pode confiar.

P: É bom isso, sinceridade absoluta.

M: Sim, criança, é isso. Você não pode mentir para si mesmo. Você não pode ser desonesto consigo próprio. Isso é real. Expor problemas e admitir erros não é Isso. Não se trata de querer alguma solução, que é querer melhorar; aqui não se trata disso. Não pode ter você e Deus. Deus não aceita concorrência, ninguém ao lado dele. Não é possível a Verdade e você. Então, que seja só a Verdade, que seja só Deus, e que você desapareça. Que esse "você" possa se dissolver nessas lágrimas sinceras. Isso significa explodir as pontes... elas ficam para trás, e não há mais como voltar.

*Transcrição de uma fala ocorrida em 10 de fevereiro de 2014, num encontro aberto online. Para informações sobre os nossos encontros, clique aqui.

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